domingo, 29 de maio de 2011

Eu sei, mas não devia

Marina Colasanti
Eu sei que a gente se acostuma. Mas não devia.

A gente se acostuma a morar em apartamentos de fundos e a não ter outra vista que não as janelas ao redor. E, porque não tem vista, logo se acostuma a não olhar para fora. E, porque não olha para fora, logo se acostuma a não abrir de todo as cortinas. E, porque não abre as cortinas, logo se acostuma a acender mais cedo a luz. E, à medida que se acostuma, esquece o sol, esquece o ar, esquece a amplidão.

A gente se acostuma a acordar de manhã sobressaltado porque está na hora. A tomar o café correndo porque está atrasado. A ler o jornal no ônibus porque não pode perder o tempo da viagem. A comer sanduíche porque não dá para almoçar. A sair do trabalho porque já é noite. A cochilar no ônibus porque está cansado. A deitar cedo e dormir pesado sem ter vivido o dia.

A gente se acostuma a abrir o jornal e a ler sobre a guerra. E, aceitando a guerra, aceita os mortos e que haja números para os mortos. E, aceitando os números, aceita não acreditar nas negociações de paz. E, não acreditando nas negociações de paz, aceita ler todo dia da guerra, dos números, da longa duração.

A gente se acostuma a esperar o dia inteiro e ouvir no telefone: hoje não posso ir. A sorrir para as pessoas sem receber um sorriso de volta. A ser ignorado quando precisava tanto ser visto.

A gente se acostuma a pagar por tudo o que deseja e o de que necessita. E a lutar para ganhar o dinheiro com que pagar. E a ganhar menos do que precisa. E a fazer fila para pagar. E a pagar mais do que as coisas valem. E a saber que cada vez pagar mais. E a procurar mais trabalho, para ganhar mais dinheiro, para ter com que pagar nas filas em que se cobra.

A gente se acostuma a andar na rua e ver cartazes. A abrir as revistas e ver anúncios. A ligar a televisão e assistir a comerciais. A ir ao cinema e engolir publicidade. A ser instigado, conduzido, desnorteado, lançado na infindável catarata dos produtos.

A gente se acostuma à poluição. Às salas fechadas de ar condicionado e cheiro de cigarro. À luz artificial de ligeiro tremor. Ao choque que os olhos levam na luz natural. Às bactérias da água potável. À contaminação da água do mar. À lenta morte dos rios. Se acostuma a não ouvir passarinho, a não ter galo de madrugada, a temer a hidrofobia dos cães, a não colher fruta no pé, a não ter sequer uma planta.

A gente se acostuma a coisas demais, para não sofrer. Em doses pequenas, tentando não perceber, vai afastando uma dor aqui, um ressentimento ali, uma revolta acolá. Se o cinema está cheio, a gente senta na primeira fila e torce um pouco o pescoço. Se a praia está contaminada, a gente molha só os pés e sua no resto do corpo. Se o trabalho está duro, a gente se consola pensando no fim de semana. E se no fim de semana não há muito o que fazer a gente vai dormir cedo e ainda fica satisfeito porque tem sempre sono atrasado.

A gente se acostuma para não se ralar na aspereza, para preservar a pele. Se acostuma para evitar feridas, sangramentos, para esquivar-se de faca e baioneta, para poupar o peito. A gente se acostuma para poupar a vida. Que aos poucos se gasta, e que, gasta de tanto acostumar, se perde de si mesma.
(1972)

 Marina Colasanti nasceu em Asmara, Etiópia, morou 11 anos na Itália e desde então vive no Brasil. Publicou vários livros de contos, crônicas, poemas e histórias infantis. Recebeu o Prêmio Jabuti com Eu sei mas não devia e também por Rota de Colisão. Dentre outros escreveu E por falar em Amor; Contos de Amor Rasgados; Aqui entre nós, Intimidade Pública, Eu Sozinha, Zooilógico, A Morada do Ser, A nova Mulher, Mulher daqui pra Frente e O leopardo é um animal delicado. Escreve, também, para revistas femininas e constantemente é convidada para cursos e palestras em todo o Brasil. É casada com o escritor e poeta Affonso Romano de Sant'Anna.

Como Produzir o Alho Negro

Como o alho fica preto?

É surpreendente saber que a cor, o sabor e a textura do alho negro é obtida sem a colocação de nenhum aditivo químico. O processo de produção é realizada pela fermentação enzimática e não pela fermentação com leveduras ou fungos, digamos que é um processo de envelhecimento e auto fermentação das enzimas naturalmente presentes no alho que na auto fermentação produz um elemento chamando melanoidin, sendo esta substância de cor escura responsável pela cor preta do alho negro. Estudos publicados nos Estados Unidos indicam um série de benefícios a saúde produzidos pelo consumo regular do alho negro, tendo ele um impacto positivo sobre a pressão arterial e lípides no sangue, assim como na atividade imunomoduladora, retardando a calcificação arterial e a aceleração da cicatrização. Exite estudos sobre o extrato do alho negro, EFLA 451, que apoia seus benefícios para a saúde do coração. Um estudo in vitro, que utilizou plasma de humanos saudáveis, mostra que o ingrediente pode inibir a agregação plaquetária causada por vários gatilhos orgânicos. Isto contribui para a saúde cardiovascular, pois a agregação das plaquetas tem um efeito negativo sobre a circulação do sangue, pois aumenta o risco de obstrução dos capilares e coágulos sanguíneos, podendo levar à trombose. A fermentação do alho negro não é nenhum segredo, para desespero daqueles que o vendem e gostariam de fazê-lo acreditar que a produção do alho negro é complicado e difícil. Todo o processo é bastante simples de fazer, tudo que você precisa é de um caixa ou forno exclusivo, paciência, dedicação e o perdão de seus vizinhos, sendo que toda a vizinhança sentirá o cheiro de alho.
Compre algumas cabeças de alho selecionadas e de bom tamanho, as mesmas devem estar intactas e firmes.









O processo acontece em uma caixa ou forno com temperatura constante de 55º Celsius. Coloque o alho em um recipiente de vidro ou de barro com tampa e junto com eles coloque também ramos de tomilho entre as cabeças e no fundo do recipiente. Pulverize-os com água, certificando-se que todas as cabeças estejam úmidas e feche o recipiente. Feche caixa ou a porta do forno e deixe durante cerca de 5 dias com temperatura constante, não esquecendo de verificar o nível de umidade, pois o alho deve permanecer úmido durante todo o processo. O ajuste da temperatura e umidade em função do tempo é um fator de tentativa e erro, menor a temperatura, maior será o tempo que o alho terá que permanecer no forno.  Existe diferentes fornos e diferenças no alho.  Às vezes, um pano molhado é colocado na parte superior dos recipientes para auxiliar na manutenção da umidade.

O tempo normal de fermentação varia entre 21 e 35 dias. O alho deve estar com uma aparência um pouco enrugada e os dentes devem estar pretos. Depois de fermentado, pode ser servidos em fatias, sendo a sua textura como uma geleia e um cheiro forte de melaço maltado com notas de licor. É uma técnica curiosa, se o alho fosse deixado à temperatura ambiente, nunca iria alterar e, se deixado em temperatura baixa, sem o recipiente, seria simplesmente desidratado. O alho negro também é conhecido como "trufa do homem pobre", que faz sentido quando você sentir o cheiro.

Edson Carvalho do Nascimento

domingo, 8 de maio de 2011

Um menino. - A boy.

Eu fui apenas um menino pobre, apesar de raramente contar minha história, as pessoas ouvem somente o que querem ouvir e descartam o resto, como resto simplesmente.

Quando fui lançado ao trabalho, pela minha velha mãe, deixei meu lar e a segurança que ele sempre representou para mim, mas ainda assim eu era apenas um menino de 13 anos.

Na inquietude da cidade grande, de olhos arregalados e medrosos, escondia-me atrás de uma aparente coragem que creio que nunca tive.

Naquele emprego, esperava apenas o cumprimento da promessa de receber um salário que deveria com urgência levar para casa, suprindo o que faltava para meus irmãos.

Houve momentos de solidão e medo, mas aquele menino de olhos grandes e amedrontados pelo vai e vem da avenida deixou os anos passarem sobre si e sempre encontrou conforto ao retornar para seu lar.

Hoje sou mais velho do que jamais fui e mais novo do que jamais serei.

Os anos que por mim passaram, hoje fazem meu corpo, meu espírito e minha mente agitar-se violentamente e eu tremo.

Não é estranho depois de tantas mudanças, não sou mais ou menos e nem o mesmo, somente tenho muita vontade de voltar para casa carregando somente as lembranças do que aqui passei, dos gritos que gritei, da vergonha e raiva.

Estou indo embora, estou indo embora!

O guerreiro ainda em mim permanece...

Eu vou para casa, lá estão as pessoas que eu amo.

Eu vou para casa...

I was just a poor boy, though rarely tell my story, people only hear what they want to hear and dismiss the rest as simply trash.
When I was released to work for my old mother, I left my home and the security it has always represented to me, but still I was just a boy of 13 years.
In the restlessness of the great city of wide, big eyes fearful, I hid behind a seeming courage that I believe I never had.
In that job, just waiting for the fulfillment of the promise to receive a salary that I should urgently take home, supplying the missing to my brothers.
There were moments of loneliness and fear, but that boy with big eyes and frightened by the coming and going of the avenue left the years go on about yourself, and always found comfort when he returned to your home.
Today I'm older than I ever was and younger than  never more will be.
The years passed by me and today the my body, my spirit and my mind shake violently and I tremble. It is not strange after so many changes, I am no more or less and neither the same and only I have a strong desire to return home only carrying the memories of what I passed here, the screams I cried, shame and anger.

I'm leaving, I'm leaving!
The warrior in me still remains ...
I go home, in there are people I love.
I'm going home...